FRNZKFK080908

Play both at the same time | Toque ambos ao mesmo tempo
Videoinstalação para filas(principalmente de repartições públicas.) Dois vídeos em loop dessincronizado criam uma composição fractal interior/exterior. Kafka esquece seu nome desperta ao lado de Charlie Parker na escuta de Glauber Rocha.
1.PAUTA:
“Toda a educação assenta nestes dois princípios: primeiro repelir o assalto fogoso das crianças ignorantes à verdade e depois iniciar as crianças humilhadas na mentira, de modo insensível e progressivo”

1.1.A viabilização da gravação digital do material necessário para a apresentação de uma videópera binaural para o Festival Tsonami [http://www.tsonami.cl].

1.2.A produção desta ATA, servirá de Programa da Performance Multimídia.



2.DO OBJETO FINAL:
“A forma, o lastimável, uma mísera sombra refugiada no recanto mais distante do reino.”
2.1.Do Público Alvo: Freqüentadores de uma repartição pública na cidade de Valparaíso no Chile, um espaço de fluxo e de pouca fixação mnemônica onde a programação anterior se pautava na programação corriqueira da teledifusão chilena. “Quem procura não acha, mas quem não procura é achado.”
2.2.Do Formato de Apresentação: Dois televisores próximo ao teto nas colunas laterais de uma sala de espera e atendimento público com dois sistemas de som independentes. “Mau é qualquer coisa que distraia.” A obra consiste em um vídeo que transita entre duas telas, com sons distintos formando uma atmosfera quadrafônica. “O mal conhece o bem, mas o bem não conhece o mal.”

3.DO PROCESSO:
“Existe uma meta, mas não caminho; o que chamamos caminho não passa de hesitação.”
3.1.Nomes Possíveis: “Das Näch Ohr”(A Orelha Noturna) ou “Café Ka”. 
3.2.Data de Gravação: Sexta-feira, 03 de Outubro de 2008 a partir das 18h07min. “O tempo é teu capital; tens de o saber utilizar. Perder tempo é estragar a vida.”
3.3.Da Gravação: “Talvez haja apenas um pecado capital: a impaciência. Devido à impaciência, fomos expulsos do paraíso e por ela não podemos voltar.” São três(3) movimentos interativos iterativos: 

I)Um primeiro tateando as intuições do espaço de cada um. "Quem possui a faculdade de ver a beleza, não envelhece." Em cortes secos e curtos sempre em silêncio para a concentração da equipe, bem como para a captação dos microrruídos do espaço. “Um homem de ação forçado a um estado de pensamento é infeliz até que consiga sair dele.””As Sereias têm uma arma mais fatal que seu canto; seu silêncio do qual o ouvido não se tapa.”
II)Repetição o mais próximo possível da primeira gravação, mas desta vez com vozes sussurradas que surgem atrás da lente e uma tentativa de dar fluidez entre os cortes propostos na primeira gravação. "Talvez haja apenas um pecado capital: a impaciência. Devido à impaciência, fomos expulsos do Paraíso; devido à impaciência, não podemos voltar."
III)Gravação sem imagem das vozes em off e de objetos tidos como relevantes à edição final do material durante o processo. “De um certo ponto adiante não há mais como voltarmos. Este é o ponto que deve ser alcançado. Há muita esperança, só não para nós.”


4. AMBIENTAÇÃO:
A cidade de Som Caos adentra pelas frestras. "Lento é o rio, rápida a sua sombra. Um peixe sobrevive ao mar e seu naufrágio.” O edifício é o corpo burocrático do pai. O edifício é a relação das portas da percepção com o muro material. Os objetos clamam mais a câmera que os homens. “He is interested in the feelings of the squash ball, and of the champagne bottle that launches the ship. In a football match his sympathy is not with either of the teams but with the ball, or, in a match ending nil-nil, with the hunger of the goalmouth.” O edifício é o órgão sem corpos do estado, o brasão da cidade. O escritório pós-burocrático é a festa dos sentidos expandidos, mas só dentro do cubículo silencioso. “Não é necessário sair de casa. Permaneça em sua mesa e ouça. Não apenas ouça, mas espere. Não apenas espere, mas fique sozinho em silêncio. Então o mundo se apresentará desmascarado. Em êxtase, se dobrará sobre os seus pés.” O escritório não vai sanar os problemas da repartição pública nem a fila. Há filas para o vazio. Os elevadores dançam para filmar a câmera de vigilância. As placas dos escritórios gestam poemas. O escritório é o corpo icônico do filho.“As minhas interrogações servem apenas de aguilhão para mim mesmo. Só quero ser estimulado pelo silêncio que se ergue à minha volta como resposta derradeira. «Até quando conseguirás suportar o facto de que o mundo dos cães, tal como demonstram cada vez com mais evidência as tuas pesquisas, está para sempre votado ao silêncio? Até quando conseguirás suportar esta ideia?» Esta, esta é que é a verdadeira grande interrogação da minha vida, uma interrogação perante a qual as outras interrogações se tornam totalmente insignificantes. Uma interrogação que diz respeito apenas a nós próprios e a mais ninguém. Infelizmente, posso responder a esta interrogação com mais facilidade do que às interrogações específicas: aguentarei, provavelmente, até ao meu fim natural. A serenidade da velhice irá formando uma resistência cada vez maior a todas as interrogações inquietantes. Tudo indica que hei-de morrer em silêncio e rodeado de silêncio, na verdade até de forma específica, e antevejo isso com uma certa tranquilidade. Um coração admiravelmente resistente, pulmões que é impossível ficarem fracos prematuramente, foram-nos dados a nós, cães, como que por ironia. Assim, sobrevivemos a todas as interrogações, inclusive àquelas que colocamos a nós próprios, como autênticas fortalezas de silêncio que somos.”
Um dos aspectos mais importantes da obra de Franz Kafka (1883-1924) é a sua crítica implacável dos fundamentos do Estado moderno, sobretudo no que concerne à mecanização da vida contemporânea e ao surgimento de uma elite administrativa altamente burocrática, hierarquizada e despótica. Ou seja, uma análise sobre as conseqüências políticas, espirituais, morais e filosóficas que a modernidade, de um modo geral, desencadeou na estrutura social. “Na Era Medieval o temporal era inessencial em relação à espiritualidade; no século dezenove o oposto ocorreu: o temporal era primário e o espiritual era o parasita inessencial que torturava-nos longe do tempo tentando destruí-lo.” Kafka é conhecido como uma das consciências mais agudas com relação à fratura de sentido na modernidade: esta fratura significa – para além da derrocada dos "mecanismos" metafísicos – a "nova" condição moderna de não possuir a "ingenuidade hermenêutica" necessária na qual se constrói a trama dos sentidos, esta "novidade", produto da técnica conceitual-administrativa humana, revela para nós que o corpo dilacerado no qual habita a fratura não é mero fruto de um deus qualquer, mas resultado de um projeto humano de futuro que permanece ativo e para o qual não há retorno – o ruído dessa fratura é o cinismo ou a mentira sobre si mesma. "É como se alguém tivesse de subir cinco degraus de escada e uma segunda pessoa apenas um degrau, mas que, pelo menos para ela, é tão alto quanto aqueles cinco degraus juntos; O primeiro vai vencer não só os cinco degraus, mas também centenas e milhares de outros, terá levado uma vida ampla e muito fatigante, porém nenhum dos degraus que subiu terá sido para ele tão importante como, para o segundo, aquele degrau único, que não só pode subir, como passar por cima." Kafka nunca esteve na Amerika.


5. PERSONMARGENS:

Nenhum rosto será filmado. “O primeiro sinal de entendimento é a vontade de morrer.” Todos estão vestidos de terno e gravata. “Associar-se com seres humanos arremessa-nos na auto-observação.” Todos são Kafka, ninguém é Kafka. Cada qual foca um aspecto de Kafka trazendo para este um enfoque irreferencial. “Poucos, mas fiéis, amigos.” Como a comunidade, estes não aceitam nem explicam os demais. “Assim existe aqui muita coisa a ser cogitada; mas isso não é nada quando comparado com o fato de que a admissão pública é um processo muito meticuloso e o membro de uma família de algum modo suspeita é rejeitado de antemão; esse indivíduo se submete, por exemplo, a esse processo, treme durante anos diante do resultado, por todo os lados lhe perguntam, com espanto, desde o primeiro dia, como pôde ousar algo tão sem perspectiva; mas ele espera –como poderia viver de outra maneira? -, mas depois de muitos anos, talvez já ancião, ele fica sabendo da rejeição, fica sabendo que está tudo perdido e que sua vida foi inútil.” Um processo artístico deve ser um machado que quebra o gelo entre nós. “Ours is a lost generation, it may be, but it is more blameless than those earlier generations.” Os coadjuvantes sempre conspiram contra os protagonistas. Ethos e Cosmos se integram, mas um não se dilui no outro. Em Kafka, um agulhão de estranhamento parece estar implantado nas próprias entranhas de cada homem e impede a possibilidade de uma síntese pessoal estabilizadora.


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